segunda-feira, julho 19, 2010

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Estava tentando estacionar quando a vi. Alta, morena, pele e osso de tão magra. No meio da rua, que era a casa dela, ela estava com as duas mãos em forma de concha no nariz, segurando um pano. E dançava...dançava sorrindo... Seus olhos estavam orbitados em um outro lugar. Eu que estava trancada em um silêncio patrocinado pelo ar condicionado do carro, pensei: nossa... como ela está hoje...totalmente tomada pela cola. Sensibilizada fiquei por aquela garota, dançando alegremente no meio da rua, sem tirar as duas mãos em forma de concha no nariz. Olhei para os lados e vi que todos a olhavam rindo de sua proeza. Não sei o motivo do riso, não sei se escárnio, não sei se compaixão, não sei...só os donos do sorriso é que poderiam dizer, mas eu não conseguia sorrir...Ela estava lá, gritando sua presença denunciadora em minha mente. Denunciando a desumanidade, denunciando o desamor, denunciando o descaso, denunciando a alegria fulgaz de uma cheirada logo ao amanhecer ou quem sabe denunciando um necessário processo de alienação de si mesma? Lembro que pensei que ela estaria ficando pior com o tempo, pois estava dançando no meio da rua, num dia chuvoso, sozinha... Foi então que passei por ela, desviando o carro e consegui estacionar, e quando saí do meu carro-aquário, precebi: um táxi estava ressoando seu som recém adquirido em uma promoção e ela dançava guiada por aquele som... pelo ritmo...percebi, com alívio, que ela não estava tão mal assim, estava apenas tentando mesmo se divertir.

(também de longas datas...)

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