terça-feira, novembro 13, 2007

O (doce) Carteiro e o Poeta

Às vezes escrever não dá a dimensão do que eu sinto. Este filme pode ser expressado mais perfeitamente por um movimento em minhas mãos, que intencionalmente, refletem a leveza e a beleza que experenciei.
Não sou nenhuma crítica, quando eu vejo um filme eu não analiso, eu experencio, eu vivo, eu entro no filme, faço parte. E, muitas vezes, me passam despercebidos os detalhes técnicos. Mas como, ao viver, se pode olhar a técnica?
Conhecia já a poesia de Pablo Neruda. Num contato fugaz. Pois ao ler Pablo, preferi Pessoa. Não como forma de comparação. Até porque são incomparáveis. E sim, pelo meu momento mesmo.
Então meu irmão, que começa a descobrir o doce lado da poesia, foi ao meu quarto e resgatou Pablo. E então foi atrás do filme e pediu que eu assistisse. Demorei 3 dias pensando se eu ia ver ou não. E resolvi ver no domingo. Belo dia para um filme como esse.
E então, surpreendentemente, me peguei com o desejo imenso de ler mais Neruda. De conhecer mais.
O filme é leve. Em um tempo inexistente em minha realidade. Parece-me que no filme o tempo tinha seu ritmo próprio que não é o tempo de agora. Os olhares, as palavras, a música, o mar, os conflitos, todos esmiuçados com calma, no tempo que lhes era necessário.
Agora, lindo foi o ator que fez o carteiro, Massimo. Ele era tão bom, tão bom, que de repente me peguei pensando se, na "vida real", ele tinha aquele jeito mesmo e o confundi com o seu personagem.
Senti junto com ele sua angústia por uma vida melhor, um lugar melhor, a busca pelas palavras, pelas metáforas, a vontade de ser poeta, o desejo de conquistar o amor, a febre de uma paixão, as desilusões pelas expectativas, a busca pela conquista de um mundo melhor. O carteiro (que acho que se chamava Mário no filme) que tinha somente um destinatário, conseguiu dar uma nova amplitude em sua vida ao se entregar para o que a vida lhe acenava.
Duas cenas me foram tocantes: uma quando Pablo diz à ele que ele tinha "roubado" uma poesia dele e ele diz que a poesia não é de quem a escreve e sim, de quem necessita dela. P E R F E I T O. Isto é falado com tanta simplicidade e sabedoria que Pablo se cala diante de sua sinceridade e angústia. A poesia não é de quem a escreve e sim de quem necessita dela. O que mais na vida é assim?
Uma outra cena quando Pablo diz que está com problemas com a água e Mário responde: vc tem água? Ele diz: não. Então Mário diz: ah então não é problema!
A realidade do vilarejo é a falta d´água, se Pablo tivesse água isso seria problema. Perfeito. A realidade de cada um é o seu retrato da perfeição (mesmo que seja imperfeito para outros).
Bem, chorei que me acabei no final, quando infelizmente Pablo não manteve o contato que Mário ansiava, e, depois de muitos anos resolve visitá-lo e a esposa diz que ele falecera. Chorei, chorei pela sua expectativa não realizada, chorei pelo seu amor que ficou não correspondido, chorei pela sua esperança (espera) que foi contemplada quando ele não mais estava lá para ver, chorei pela violência da forma como ele morreu e devo, em algum nível, ter chorado por mim também.
Então, não contente, fui ver os extras do filme e então, eis que vem a notícia de que o ator que fez o carteiro morreu ou durante o filme ou no final das filmagens. E aí eu chorei de novo, e experenciei um sentimento de pesar por ele que eu nem conhecia. Mas que, ao viver e morrer pela sua arte, me fez renascer de alguma forma.

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